O custo de desenvolver um novo medicamento vs. os preços altos dos medicamentos | The cost of developing a new medicinal product vs. the high prices of medicines

Foi publicado este mês mais um estudo pelo Centre for the Study of Drug Development da Tufts University no Massachusetts – EUA que conclui que o custo de desenvolver um novo medicamento é simplesmente brutal.

Os custos estimados por este tipo de estudos têm vindo a aumentar. Em 2003, o primeiro estudo deste centro estimou um custo de 0,8 mil milhões de dólares por novo medicamento aprovado. Outros estudos mais recentes estimaram que um custo sitaudo entre 1,2 mil milhões e 1,8 mil milhões de doláres. Este novo estudo mais que triplica a 1.ª estimativa, elevando-a para 2,5 mil milhões de dólares, ou seja, 2 558 000 000 $.

Estes valores são usados pela indústria farmacêutica para explicar os preços cada vez mais exorbitantes dos seus novos medicamentos. Existem, no entanto, inúmeras críticas a este valor. É baseado em dados confidenciais fornecidos por algumas empresas, que são financiadoras do próprio centro que publica o estudo. A estimativa tem em conta os custos dos medicamentos que não chegam ao mercado e também o custo do capital utilizado na I&D (e assumindo que teriam um retorno de 10,5% por ano se estivesse a ser utilizado de outra forma).

É preciso ainda ter em conta que muitos dos medicamentos oncológicos e que salvam vidas são os que têm preços muito elevados. Mas estes medicamentos não têm um desenvolvimento típico, pois as autoridades reguladoras como a Agência Europeia do Medicamento, aceitam e até incentivam a sua aprovação baseada ensaios clínicos com número reduzido de doentes, o que reduz muito os encargos nestas fases do desenvolvimento. E quando conseguem o estatuto de “medicamento órfão”,  as empresas têm direito a incentivos fiscais, que não são considerados no estudo. Ou seja, a estimativa é inflacionada por medicamentos que são nada ou pouco mais eficazes que os pré-existentes mas que necessitam de grandes ensaios clínicos para obterem a autorização de introdução no mercado.

Reflitamos sobre isto enquanto olhamos para os medicamentos que detêm atualmente o recorde de preço.

Soliris (eculizumab),medicamento órfão destinado ao tratamento de duas doenças raras, hemoglobinúria paroxística noturna (HPN) e síndrome hemolítico urémico atípico (SHUa), tem um custo de tratamento anual por doente de cerca de 500 mil euros, e o tratamento é crónico. Em Portugal, segundo dados do Infarmed, os hospitais do SNS gastaram entre janeiro e setembro deste ano cerca de 1,7 milhões de euros com este medicamento, apesar de se estimar que estejam a ser tratados menos de 10 doentes.

Glybera (alipogene tiparvovec), também um medicamento com a designação de órfão, e o 1.º medicamento de terapia genética, é destinado a doentes com deficiência familiar da lipoproteína lipase (LPLD). Terá proposto à Alemanha um preço de 53 mil euros por frasco, o que corresponde a cerca de 1100 mil euros por ano para um doente médio. O medicamento ainda não se encontra comercializado em Portugal.

Texto baseado livremente nos seguintes artigos:

The price of failure, publicado no The Economist em 29/11/2014;

UniOure sets price record with Glybera, por Douglas W. House, publicado no site Seeking Alpha em 26/11/2014.

 


This month another study by the Centre for the Study of Drug Development at Tufts University in Massachusetts – USA concluding that the cost of developing a new drug is simply brutal was published.

The estimated costs of a new medicine by this type of studies has been increasing. The first study by this centre estimated in 2003 a cost of 0.8 billion dollars per new approved medicinal product. Other more recent studies give an estimate between 1.2 billion and 1.8 billion dollars. This new study more than triples the 1st estimate, increasing it to 2.5 billion dollars, or $ 2.558.000.000.

The pharmaceutical industry uses these values to explain the increasingly exorbitant prices they charge for new drugs. There are, however, several cristicims to these new value. It is based on confidential data provided by some companies, which are the funders of the centre publishing the study. The estimate takes into account the costs of medicines that do not reach the market and the cost of capital used in R & D (and assuming that it would have a 10.5% return per year if it were used otherwise).

One must also take into account that many of the life-saving cancer medicines are the ones with very high prices. But these medicines do not have a typical development because the regulatory authorities such as the European Medicines Agency, accept and even encourage their approval based on clinical trials with A small number of patients, which greatly reduces the financial burden of the development. And when they get rare disease (orphan) designation, companies are entitled to tax incentives, which are not considered in the study. That is, the estimate may be inflated by medicinesthat are slightly or no more effective than pre-existing ones but that need large clinical trials to obtain marketing authorization.

Lets think about thos as we look at the medicines that currently hold the price records.

Soliris (eculizumab), an orphan medicinal product for the treatment of two rare diseases, paroxysmal nocturnal hemoglobinuria (PNH) and atypical hemolytic uremic syndrome (aHUS), has an annual cost of treatment per patient of about 500 thousand euro, and the treatment is chronic. In Portugal, according to data from Infarmed, NHS hospitals spent between January  and September of this year about 1.7 million euros with this medicine, although it is estimated that less than 10 patients are being treated .

Glybera (alipogene tiparvovec), also a medicinal product with orphan designation, and the 1st drug gene therapy, is intended for patients with familial lipoprotein lipase deficiency (LPLD). The companie has proposed a price of 53,000 euros per bottle to Germany , which is about  1.1 million euros per year for an average patient. The medicine has not yet been commercialized in Portugal.

Text freely based on the following articles:

The price of failure, published in The Economist on 29 november 2014;

UniOure price sets record with Glybera, by Douglas W. House, published in Seeking Alpha site on 26 november 2014.

A bebé prematura que nasceu no Dubai | The premature baby born in Dubai

Clipboard01

Diário de Notícias 04/11/2014

 Esta notícia leva-me a abençoar a existência do Serviço Nacional de Saúde, onde o acesso aos cuidados de saúde é para todos, mesmo estrangeiros.


“Portugal requested the transfer of the baby | Dubai | The Portuguese Government requested yesterday to the authorities in Dubai the transference to a public hospital of the baby, daughter of Portuguese citizens, born prematurely in a private hospital, after her parents run out of money for the 50 thousand euro treatments that she needs in order to survive.” News in Diário de Notícias 4th November 2014

This news story reminds me to bless the existence of the Portuguese Healthcare System, where access to healthcare services is for everyone, even foreigners.

A lei dos pequenos números | The law of small numbers

Há pouco tempo li o livro “Pensar, Depressa e Devagar” de Daniel Kahneman, psicólogo e vencedor do Prémio Nobel das Ciências Económicas em 2002. Não, não me enganei, Daniel Kahneman não é economista.

A leitura foi muito interessante e tenho vontade de revisitar o livro. É curioso tentar perceber como é que a nossa mente funciona, e porque é que as pessoas são seres tão irracionais nas suas opiniões e nas decisões que tomam (eu estou entre elas!).

Um dos primeiros capítulos que me chamou mais a atenção intitula-se “A lei dos pequenos números”. A ilustração desta lei é dada através do seguinte exemplo:

“Um estudo sobre a incidência do cancro do rim nos 3141 condados dos Estados Unidos revela um padrão notável. Os condados em que a incidência do cancro de rim é mais baixa são sobretudo rurais, escassamente povoados e localizados nos estados tradicionalmente republicanos no Midwest, no Sul e no Oeste.” O livro refere que é fácil de intuir que “a baixa taxa de cancro se deve diretamente ao puro estilo de vida rural – sem poluição do ar, sem poluição da água, com acesso a alimentos frescos, sem aditivos”.

No mesmo estudo, para os condados em que a incidência de cancro do rim é mais elevada, “tendem a ser sobretudo rurais, escassamente povoados e localizados nos estados tradicionalmente republicanos no Midwest, no Sul e no Oeste”. Ironicamente, é também fácil inferir que “as suas altas taxas de cancro poderão estar diretamente ligadas à pobreza do estilo de vida rural – sem acesso aos cuidados médicos, uma dieta rica em gorduras e muito álcool e muito tabaco”.

Onde está o erro? O fator essencial é que os condados rurais têm pequenas populações. E os resultados extremos, taxas de cancro muito altas ou muito baixas, tendem a ser encontradas em amostras pequenas. A incidência do cancro não é na realidade diferente do normal, apenas parece sê-lo em dado período devido a um acidente da amostra, i.e., artefactos.

O ponto deste capítulo é que nós não somos bons estatísticos intuitivos. Apesar de a maior parte dos investigadores saberem que as amostras grandes são mais precisas, é difícil nos apercebermos intuitivamente que isso significa exatamente o mesmo que as amostras pequenas produzem resultados extremos com maior frequência que as amostras grandes. Isto porque estamos construídos para construir histórias coerentes, com causas. Mas as estatísticas produzem muitas observações que parecem requerer explicações causais, mas que não se prestam a explicações destas. São muitas vezes devidas ao acaso e as explicações causais estarão, por isso, erradas.


A while ago I read the book “Thinking, Fast and Slow” by Daniel Kahneman, a psychologist and winner of the Nobel Prize in Economic Sciences in 2002. No, that is not wrong, Daniel Kahneman is not an economist.

The reading was very interesting and I long to revisit the book. It is very appealing to try and understand how our mind works and why people can be so unreasonable in their opinions and in their decision-making (and I am amongst them!).

One of the first chapters that grabbed my attention is called “The law of small numbers”. The illustration of this law is given by the following example:

“A study on the incidence of kidney cancer in 3141 counties in the United States reveals a remarkable pattern. The counties where the incidence of kidney cancer is lower are mostly rural, sparsely populated and located in traditionally Republican states in the Midwest, the South and West”. The book states that it is easy to believe that “the low rate of cancer is directly attributable to pure rural lifestyle – no air pollution, no water pollution, access to fresh food without additives.”

In the same study, counties in which the incidence of kidney cancer is higher, “tended to be mostly rural, sparsely populated and located in traditionally Republican states in the Midwest, the South and West”. Ironically, it is also easy to infer that “higher cancer rates may be directly linked to the poverty of rural lifestyle – no access to medical care, a diet rich in fats and too much alcohol and tobacco.”

Where is the mistake? The essential factor is that rural counties have small populations. And the extreme results of very high or very low rates of cancer tend to be found in small samples. The incidence of cancer is not really unusual, it just seems to be so in a given period due to an accident in the sample, ie, artifacts.

This chapter’s conclusion is that we are not very good in intuitive statistics. Although most researchers know that large samples are more accurate, it is difficult to realize intuitively that means exactly the same as small samples produce extreme results more often than large samples. This is because we are built to elaborate coherent stories. But statistics produce many observations that seem to require causal explanations, but do not lend themselves to those type of explanations. This are often due to chance and causal explanation will therefore be simply wrong.